As últimas decisões de José Eduardo dos Santos e as implicações para o futuro de Angola têm sido motivo de debate nos meios políticos e académicos. Ex-presidente assinou decretos que beneficiam a filha e as elites.Poucos dias antes de deixar o poder, José Eduardo dos Santos assinou vários decretos e despachos, alguns deles publicados no dia seguinte à tomada de posse do atual Presidente da República, João Lourenço, como a concessão, por 60 anos, dos terrenos da marginal da Corimba, em Luanda, a duas empresas privadas - uma delas propriedade de Isabel dos Santos, filha do líder cessante. José Eduardo dos Santos também reconduziu as chefias militares e dos serviços secretos e mexeu nas estruturas da Sonangol, atribuíndo a sua gestão completa à figura do presidente do Conselho de administração, a sua filha Isabel dos Santos, esvaziando desta forma os poderes do seu sucessor na gestão da principal empresa pública do país. Essas últimas decisões do ex-Presidente de Angola, que esteve no poder durante 38 anos, poderão condicionar e tirar a autoridade à governação de João Lourenço, considera Felisberto Amado, professor do Instituto Superior Politécnico Católico de Benguela (INSPOCAB). "E em termos de futuro, isso pode também hipotecar algum desenvolvimento e alguma dinâmica que a nova equipa governamentaltenta empreender para o desenvolvimento do País", salienta. Quanto ao resto, o académico considera que ainda é muito cedo para saber quais serão, de facto, as implicações. "Mas pode-se levantar questões de ética e de moral, porque até ao último dia do seu mandato, o ex-Presidente não devia realizar uma série de atividades", critica Felisberto Amado. Interesses das elites O especialista em relações internacionais Sténio António defende que as decisões tomadas por José Eduardo dos Santos antes de abandonar o poder devem ser entendidas como parte do processo de transição política de acomodar algumas figuras militares e os interesses económicos das elites. "O Presidente cessante queria ter algumas garantias e acomodar algumas pessoas no poder", afirma, dando como exemplo o caso da petrolífera estatal Sonangol. Por outro lado, o professor de relações internacionais sublinha, por outro lado, que os decretos assinados pelo ex-Presidente a favor das chefias militares e vários grupos empresariais visam essencialmente desincentivar eventuais desencantos e uma possível instabilidade política no país, com a sua retirada do poder, por parte da elite que esteve só seu lado durante décadas. "Estamos a viver uma transição e é preciso que os seus impactos sejam minimizados. Isso não quer dizer que o Presidente cessante não tenha confiança no novo, mas o poder e a confiança têm de ser paulatinos", explica Sténio António. O académico Felisberto Amado não tem dúvidas: "São implicações que, mais uma vez, podem não deixar bem na fotografia o ex-Presidente, mas só ele é que sabe porque é que tomou essas decisões e o que, de facto, quis precaver".
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